quinta-feira, 2 de setembro de 2010



A valorização do submundo da cozinha

O chef de Manhattan, conhecido como amante do submundo e autointitulado de nerd da comida, viaja pelo mundo a fim de conhecer novos hábitos culinários.

Conhecido por seu lado irônico, o apresentador de TV do programa “Anthony Bourdain – Sem Reservas” usa os offs para revelar o que realmente pensava quando comia determinado prato. Em cada episódio, Anthony embarca para um país a fim de descobrir como as pessoas se alimentam em diferentes partes do mundo.

Assisti-lo tomando um porre de vodka e depois sendo “espancado” com ramos de sálvia em uma casa de massagens na Rússia é cena aceitável para quem confere todos os programas e passa a conhecer melhor esse chef de humor ácido e amante de coisas bizarras.
O que o tornou famoso foi seu livro “Kitchen Confidential: Adventures in the Culinary Underbelly” (“Cozinha Confidencial”, Companhia das Letras), sobre o submundo da cozinha. Nele, declara que se adapta muito bem à “hierarquia militarizada e ao caos ordenado da cozinha”. Para ele, tal ambiente é confortável como um banho de banheira.
O escritor Charles Bukowski parece inspirar Anthony em suas missões boêmias e cheias de comidas gordurosas. Assim como nos livros do velho contista americano, o chef tem um charme de solitário e é amante do punk-rock. Formou-se no Culinary Institute of América em 1978 e administrou diversos restaurantes em NY, como o Supper Club, One Fifth Avenue e o Sullivan’s. Atualmente ele é gourmand do bistrô Brasserie Les Halles em Manhattan
A partir do lançamento do livro, que hoje é best-seller, Anthony tornou-se conhecido da mídia e hoje está à frente do programa Sem Reservas. No reality, ele procura o estranho e selvagem em suas viagens. E como chef se interessa pela forma como as pessoas comem em outros países, cidades e vilarejos. Entre os lugares que visitou estão Malásia, Coréia, China, Porto Rico, Sicília, Toscana, Praga, Londres, Nova York, entre outros, até mesmo São Paulo.
Na cidade paulistana ele conheceu o Mercado Municipal, fornecedor de alimentos para diversos restaurantes e construção histórica que recebe visitas de paulistas e turistas aos fins de semana. Além de comer um autêntico pão na chapa no café da manhã e provar um ovo empanado no boteco. Ele diz que aprendeu a gostar da cidade que chamava de “feia” anteriormente.
O canal de viagens rendeu a brincadeira de que há dois Anthonys, o Tony do mal e o Tony bonzinho. O apresentador sarcástico tem sempre um comentário sobre a viagem, o anfitrião, os costumes locais e a comida. A situação tem que ser realmente comovente ou trágica para que ele se deixe levar pelas emoções. Ele amoleceu bastante em dois momentos ao longo de suas viagens. Uma vez no Brasil, quando foi convidado para um samba com feijoada, e ao lado de três mulheres e, claro, depois de algumas caipirinhas, sentiu-se confortável, livre da “carapuça rabujenta” que o acompanha.
Outra vez foi no Vietnã, quando decidiu conhecer vítimas de minas submersas no país, resultado da 2ª Guerra Mundial, e foi convidado para almoçar com uma família em que o pai não tinha uma perna, por conta de uma mina de guerra. O sentimento de culpa, por sua nacionalidade americana, o fez ficar calado, sem emitir comentários engraçadinhos, e apto para receber de coração aberto o que lhe ofereciam para comer.
Em alguns momentos, comer a comida local exige certos sacrifícios. Como na viagem para Namíbia, onde o chefe da tribo que o recebeu ofereceu a carne de “Warthog”, um animal da família do porco, que Anthony já sabia estar contaminado com bactérias e micróbios. Ele, porém, comeu silenciosamente e agradecido. Posteriormente declarou: “O chefe está lá, em frente a toda sua tribo, oferecendo a você o que tem de melhor. Mostre respeito. Tenho sorte de estar lá. Tenho sorte de ver aquilo. Tenho sorte de ter aquela experiência. Engolir alguns antibióticos é um preço muito baixo a se pagar”.
É isso que o motiva a continuar colocando à prova seu organismo. Em seu livro, “The Nasty Bits” (“As Partes Nojentas”), ele descreve, como o título diz, os momentos desagradáveis do programa de TV. Uma das cenas é de uma família de esquimós que caça uma foca e convida Anthony para comê-la crua. Eles colocam um pedaço de plástico no chão, a foca por cima, e vão abrindo a cabeça dela, retirando os pedaços de carne, as gorduras, e comendo da forma que encontram. Todos participam deste momento, a avó, a mãe, o pai, as crianças, com extrema naturalidade. Ao final, a avó pega algumas blueberries (espécie de fruta, da América do Norte) mergulha-as na carne e na gordura da foca e entrega para o apresentador comer. “Elas eram deliciosas”, conclui Tony.
Ele tenta expressar esses momentos com o máximo de respeito, pois deseja conhecer aquela cultura diferente da sua. Sobre a cena da foca ele explica em seu livro: “Você tinha que ter sentido o frio lá de cima, ter visto aquilo, centenas e centenas de milhas sem sequer uma árvore. Você tinha que ter ido caçar lá fora com o Charlie (pai da família), como eu fui, naquela baía congelante, um corpo de água perto do gigante oceano. Observá-lo a andar por trechos estreitos, escavando o gelo para arrastar a foca de volta para a canoa. Ouvir, como ouvimos, as resignadas chamadas de outros caçadores no rádio de Charlie, emperrado numa nevasca noite a fora, percebendo que eles não teriam abrigo nem fogo. Você teria que ter estado naquela cozinha”.
A partir dos olhos de Tony, o telespectador pode ver o que não é clichê e mergulhar na cozinha de um restaurante ou de uma família, no jeito de comer de outras pessoas e conhecer um lugar que não é para simples turistas, mas para quem deseja tornar-se parte, mesmo que por alguns dias, do país em que se encontra.

E isso é talvez o que diferencia Sem Reservas de outros programas culinários. A partir da valorização do submundo da cozinha, do entendimento de que o ato de se alimentar não é igual para todos, é possível, então, compreender que apreciar o sabor da culinária local é único e pode ser delicioso mesmo para os forasteiros.
Os novos episódios do programa têm entre os destinos Istambul, na Turquia, Rajasthan, na Índia e Egito. Os programas são exibidos no canal a cabo Discovery Travel & Living às quartas-feiras às 23 horas, com horários alternativos às quintas-feiras às 21 horas, sábados às 22 horas, e domingos às 19 horas.


Foto: Divulgação

*Publicada na edição 93 da Revista Alta Gastronomia

terça-feira, 19 de maio de 2009

"Vicky Cristina Barcelona"

Por qué tanto perderse tanto buscarse sin encontrarse
me encierran los muros de todas partes
Barcelona te estas equivocando no puedes seguir inventando
que el mundo sea otra cosa y vuela como mariposa

Barcelona hace un calor que me deja fría por dentro
con este vicio de vivir mintiendo
que bonito seria tu mar si supiera yo nadar

Barcelona mi mente esta llena de cara de gente extranjera
conocida, desconocida, y a ratos es transparente no existe más
Barcelona sigo esposa de tus ruidos tu laberinto extrovertido
no he encontrado la razón porque me duele el corazón
porque es tan fuerte q solo podré vivirte
ni la distancia ni escribirte una canción

Te quiero Barcelona
ella tiene el poder
Barcelona es poderosa

http://www.youtube.com/watch?v=VMDxq9HZxek

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Vale!!

A viagem pra Espanha começou no calor e na beleza da estação de Atocha. Com dez horas o que pude fazer na cidade foi ir ao Museu do Prado e ao Reina Sofia. O primeiro com uma coleção incrível de Velázquez e de Ribeira. Mas, além de "As Meninas", são absurdos "Saturno devorando seu filho" do Goya e "David Victorius sobre Golias" do Caravaggio. O que me chamou atenção foram os desenhos de carne, pele. Os nus rodeados por uma esfera dramática. E a compreensão de como Velázquez intelectualizou a arte com espelhos e olhares de enfrentamento dos personagens para com os espectadores.
Estava mais ansiosa, confesso, para os modernos do Reina Sofia. Lá conheci um novo-velho fotógrafo surrealista: André Kerész. Cometi o erro de não levar uma caneta comigo e por isso tenho receio de confundir o comentário! Também vi Man Ray. O museu tinha um vídeo e um pêndulo gigante que expressava a tensão sexual entre ele e a esposa.
Deliciada com as duas visitas decidi tomar uma cerveja madrilena e fui em direção ao bairro La Latina. Um típico bairro de praia, sem praia. Fui parar em uma taverna com lugar pra sete pessoas. Por sorte lembrava dos vinhos do pub de Londres, que na realidade serve bebidas espanholas. O dono simpatizou e acabou me dando Ribeiras, Sauvignons e Riojas de graça. Mais uns tapinhas, a comida pequena e típica dos espanhóis, geralmente azeitonas, tortilhas, sanduichinhos, chorizo...
Orgulhosa da minha noite sozinha em Madrid fui pro aeroporto dormir...por duas horas.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

E quinta eu vou pra Madrid e pra Barcelona!!!
Não vejo a hora de me enfiar nos castelos do Gaudí!

Escócia

Amo os escoceses. Ontem no Pub estava cansada dos bundinhas moles dos ingleses. Quando um casal de escoceses me chamou e me deu um abraço. Claro que eu já tinha feito quatro mojitos pra eles. Mas isso eu jamais poderia esperar de um londrino. O casal me convenceu a ir pra Edimburgo pra esquiar. Me disse que na Escócia todo mundo te recebe com um abraço.
Já aqui reina a anti-cordialidade. O que parecia bom a principio, mas começa a cansar...

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Lamba-Zouk

Você sabe o que é zouk? Definitivamente é algo que eu não esperava aprender em Londres. A aula começou quando uma versão do Nelsão gay (pra quem não sabe, Nelson era meu professor de educação física no colégio) com uma bandana na cabeça se apresentou. Alguma de vocês já dançou lambada?
Lembrei dos tempos remotos, quando meu pai me chamava pra dançar e eu batia praticamente nos joelhos dele. "Não, nunca dancei"- respondi. Estávamos eu, uma japonesa e uma suiça dois minutos depois se esticando em um aquecimento com dança contemporânea. A versão feminina do Nelson, juro é igual, media uns dois metros de altura e usava duas polainas vermelhas, a bandana azul na cabeça e dois elásticos cor-de-rosa nos pulsos.
O bar fica em Notting Hill. Só negão chegado jogando xadrez, entornando umas cervejas e jogando sinuca. Nos fundos duas portas enormes e dentro um palco enorme, com uma bateria e um piano (que funcionam nas noites de blues). As aulas custam 3 pounds. Uma barganha. Ganho nove pounds só com as gorgetas no bar que trabalho.
Os exercícios bizarros misturam balé e yoga. Só tivemos que imitar a Nelsão. Depois de uma hora chegaram os outros alunos. Esses decidiram pular a parte contemporânea e ir direto pro remelexo. Zouk é uma espécie de lambada hipnotizante. A música é geralmente cantada por um bonito português angolano, um baita suingue e uma letra breguíssima. Grande parte vem do improviso da dupla. Os movimentos vão de rodopios à abaixadas, giradas de braço, de cabeça, cruzadas de perna a vôos saltitantes na pista. (vôo não tem mais acento, né?)
Enfim, momento emocionante: Nelsoa me chama pra dançar. Simplesmente fluiu. A lambada dos meus quatro anos de idade ajudaram. Que emoção, estava me sentido conduzida por uma bailarino. Aquilo é uma piração tão grande que você se sente voando na pista. Ouvi um "very good", quase chorei ao som do português cantando blasfêmias.
Essas serão minhas próximas segundas-feiras, que alegria!

domingo, 29 de março de 2009

"Tanta Saudade"

Sete. Esse foi o número de vezes seguidas que eu assisti "Tanta Saudade", do Djavan com o Chico. (http://www.youtube.com/watch?v=Z4u55qGIerU)
Tava sentindo uma saudade imensa da música boa. Cansada de ouvir música do rádio londrino. A coisa parece tão feia (em termos musicais) por aqui que tem só três clubes de jazz. Fui até um na Carnaby Street sexta-feira, doida pra ouvir música que fala, que toca.
Acabei conversando com o velhinho da gaita, que tinha à disposição umas trinta gaitas durante o show. Ele me disse que o único bar de jazz no qual ele toca há quinze anos é aquele. Por falta de lugar. Ele mesmo falou: "Não entendo por que alguém não chega e diz, pô isso é uma boa idéia, vou abrir outro bar".
A apresentação foi bem legal, mas o blues não era exatamente o que eu estava procurando. Esse vídeo era o que eu estava procurando. Tanto que, mesmo com o áudio bem prejudicado, foi a melhor coisa que ouvi nos últimos 50 dias.
A saudade tá aumentando...

sábado, 21 de março de 2009

Borough Market




Hoje acordei com fome. O dia começou no Borough Market. Um mercado onde estão os melhores queijos, tortas, trufas, legumes, linguiças, geléias e azeites de Londres.
Fui tomar café da manhã com a Ju lá. Estávamos encantadas. Antes de decidir o que comer, estava entre uma paella e um sanduíche com chorizo, experimentamos umas trufas com café, mel, gengibre e bayles.
Depois foi a vez dos azeites. As texturas mais variadas. Cheiros e gostos de limão, de manjericão, de vinagre balsâmico.
Queijos e queijos, franceses e italianos. Os italianos parecem mais duros e densos, como a italianada. Enquanto os franceses eram mais cremosos, com sabor mais delicado.
Uma orgia de comida.
Depois de lá, fomos pro St. Jaymes Park. Com um sol lindo e um vento de congelar os ossos. O parque estava coberto de cerejeiras, esquilos, patos, pelicanos e gente, muita gente.
A Ju teve a brilhante idéia de irmos pra sorveteria da Haagen Dazs. Sim, uma vez que se começa a comer, é difícil parar! Dá-lhe crepe com banana, doce de leite e sorvete de creme!
Depois de lá, não satisfeitas, fomos comer um waffle na Oxford Street. Quinze quilos mais gorda, voltei pra casa muito feliz e com uma cerveja alemã na mão!


terça-feira, 17 de março de 2009

Candem Town


Quinta passada conheci o bairro "punk" de Londres. Candem Town parece uma grande butique a céu aberto. Cheio de espartilhos, cintos, cintas ligas, camisetas lindas, broches, lenços, botas. Uou. Quase acabei com meu dinheiro. Comprei uma jaqueta de couro, sim! E uma bota panqueca.
Algumas lojas eram bem antigas, cheias de vestidos meio medievais, meio de puta, meio de punk.
Os restaurantes vegetarianos valem a pena!
As duas principais feiras são a Candem Lock e a Candem Market. Todas com All Stars lindos e camisetas do caramba.
Nunca pensei que gastaria tanto no bairro "punk". Ainda volto pra comprar a meia arrastão...

Em Londres de pijama

O Pub Camino

O dia começa quando você tem roupas pra sair de casa. Hoje tinha um treinamento no meu trabalho, tinha que experimentar e aprender a fazer coquetéis. Dá para imaginar a minha ansiedade para tal tarefa. Acordei às 7 da manhã e fui ao banheiro. Estava naqueles dias em que você abre um sorriso para o espelho. Qualquer lugar que refletisse minha imagem era um motivo para eu sorrir. Até que meu rosto começou a mudar de forma...
Lembrei que havia deixado a chave dentro do quarto! Minha porta se fecha para todo o sempre uma vez que ela bate. Assim, ao tentar girar a maçaneta descobri que estava presa para fora do meu quarto.
Virei uma neurótica. Fui até o andar de baixo e acordei os espanhóis para me ajudar. Pedi dinheiro e um celular. O celular do garoto tinha 50p, o suficiente para duas ligações. Liguei para a minha roomate e combinei de encontrá-la em Chelsea (uns 40 minutos da minha casa).
Fui de pijama, uma linda blusa cor-de-abóbora e uma calça verde limão.
Peguei as chaves e voltei pra casa a tempo de avisar no trabalho que atrasaria uma hora.
Passado o perrengue, foi só delícia. Experimentei margueritas, mojitos, caipirinhas, sangrias, cavas, rum, gim, tequilas e cervejas. Sim, no café da manhã. O restaurante é espanhol, mas a cachaça e a caipirinha, por motivos óbvios, foram acrescentados no menu.
Saí de lá com muita informação na cabeça, estômago vazio e um tanto bêbada.
Depois de um Mcdonald´s fui pra aula de inglês e...surpresa! Um teste para a turma de Cambridge! Enfim, a sorte era que o exame tava coxinha. E a embriaguez ajudou na redação.
Antes de voltar pra casa comprei Leffs e pipoca pros espanhóis e chocolate pra roomate, afinal, causei na casa e sabe-se lá quando esquecerei as chaves novamente!..


terça-feira, 25 de novembro de 2008

Dia de cão

Sempre que tudo dá errado em meu dia, penso naqueles cães raivosos cheios de espuma na boca. O problema é que não tenho espuma, e nem sempre os outros percebem o limite da minha loucura.
Nesses dias espumosos somos como um imã de xingamentos, ira, tristeza dos outros. É como se a nossa raiva atraísse a dos outros e assim fosse aumentando até um limite, que ainda não sei qual é.
Hoje não confio em quase ninguém. E tenho que me preocupar com o fraco escudo que ainda me resta. Escudo feito de cascas porosas, por onde observo mais pessoas agredindo umas às outras.
A situação que me fez misturar tudo aconteceu hoje, quando um louco me perseguiu, tentou me enfiar dentro de um carro. Fiquei com muita raiva da covardia dele, mas além de tudo indignada pela fragilidade de ser mulher.
Em um mundo que espera a realidade de um contrato social, a valentia, o preconceito, a força ainda são as maiores armas contra a mulher. E fico esperando a inversão da situação. Quando vou poder ser boa, sem esperar um tapa na cara. Quando um ato violento terá em troca o desprezo. Quando a minha ingenuidade não atrairá descaso. Quando o egoísmo não será mais a principal força dos seres humanos.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Quero parar com essa babaquice de escrever coisas sentimentais.

Quero lama pelos poros

"Era ainda jovem demais para saber que a memória do coração elimina as más lembranças e enaltece as boas e que graças a esse artifício conseguimos suportar o passado". A frase é de García Márquez, o colombiano que consegue permear o tempo, como se conseguisse voltar cem anos atrás e arrancar pedaços de momentos para trazer até nós. A frase é de um tom pessimista, mas serve para botar os pés no chão, bem perto das ranhuras de um solo seco em que pisamos. A minha mania de elocubrar é absurda. Tenho vivido de mitificar os outros. Não todos. Especificamente uma pessoa. Não por minha culpa, eu tentei pegar a realidade pela mão, sentir o mais duro dos encontros entre os corpos. Um duro que pode se tornar líquido, que desejo tornar líquido. Mas que só pode assim se fazer, se deixar conhecer. Com uma puta audácia, trocaria o "suportar o passado", por suportar o presente. Porque tenho tido a necessidade de recorrer à ficção para suportar a realidade, para entendê-la. Trata-se de um desespero de deixar as delícias serem adiadas. Querodeixar de pisar em ovos, quero ou flutuar, ou afundar os pés na lama.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Gal

Gal. Da pureza e sensualidade transformou dois. Vontade de escrever bonito vem com felicidade, às vezes sai bobo, outras profundo. Me sinto uma criança boba, a balançar os braços e as mãos cruzadas, de um lado para o outro. A trança brota com um laço, a boca pede água, a sede não passa. Gosto de pêssego, o líquido escorre como um rio. Não esperava não, Bethânia antes me convencia mais, com toda aquela dramaturgia. Mas eis que me apaixonei de novo, mas a sensação é mais delicada, é gal.

domingo, 23 de dezembro de 2007

Nunca estamos sós

Estou farta de sentir dores no peito, feridas que não cicatrizam, e vão formando imensas quelóides. Uma por cima da outra. Meu estômago dói. O ar é suficiente apenas para manter-me viva, a sentir essa tristeza que me toma.
Por que fui inventar aquela promessa? Devia saber que Iemanjá era forte demais e coração demais, e não poderia me dar um amor sem os rebuliços do mar...
Ganhei sim o amor, a música, a paixão, a companhia, mas também a dor, o choro, as lágrimas, que me fazem lembrar de onde ele veio.
Por isso, cuidado ao desejar. Para não perder-se entre o bem e o castigo. Existirá um que prevalece?
Não, não posso ser cética e fingir que tudo isso esteja acontecendo assim ao acaso. Não se trata de acaso, e sim, de um acordo cerrado entre as ondas, as espumas e as águas daquele dia em que fui desejar.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Cheiro de peixe

Quem gosta de ser uma sardinha? É o que me pergunto toda vez que saio de casa depois das seis da tarde a fim de ir para a PUC. A lotação Jardim Jaqueline é um abuso aos cidadãos que buscam dignidade, direito a um bom transporte público, chegar ao trabalho, manter a coluna vertebral inteira e a calma controlada.

A começar que quase não se consegue entrar na "lotação" (e que nome medonho!), pois a porta é a mesma para quem sai. Além dos bancos lotados e caindo aos pedaços, muitas, mas muitas, pessoas em pé se colando umas as outras se aglomeram no veículo.

E como se não bastasse o absurdo da situação, o cobrador sempre gosta de dizer: "Vamos lá pessoal dêem mais um passinho para trás, lá no fundo tá vazio que eu estou vendo daqui...". Diz isso com a intenção de colocar os que chegam ao carro mais rápido e claro ganhar mais dinheiro, deve pensar ele que ganha também a simpatia dos que acabam de chegar, pois terão alguns milimetros a mais para se acomodarem.

Na segunda-feira aconteceu então o ápice, a tradução do espírito de porco em um homem: o motorista do Butantã-USP que passa na PUC lá pelas 23h quis me aleijar. Estava tentando descer quando senti que faltava algo. Era minha perna, que estava do lado de fora sendo esmagada pela porta do busão. O motorista (cujo nome pretendo descobrir para não acusar tantos outros simpáticos motoristas do Butantã) resolveu que eu demorara para descer do ônibus "dele" e resolveu me trancar para dentro, fechar a porta em mim, e ainda deixar minha perna presa do lado de fora.

Comecei a gritar desesperadamente, pedindo que ele não fechasse a porta. Depois de alguns segundos ele resolveu abrir, o carro ainda estava parado. Ele quis foi me dar um castigo, pois o tempo em que permaneci sem perna, era o tempo dele me deixar descer sem acidentes. Comprovei isso, pois uma colega minha estava junto e ouve todos os dias ele dizer..."e aquela sua amiga héim, precisa ser menos folgadinha..."

Quando desci até tentei achar alguma graça na situação. Mas não houve. Então tentei pensar no que fazer, ir à polícia, anotar a placa do ônibus, ligar na prefeitura, nas rádios. Acho que as opções 1 e 2 não funcionariam, prefiro as duas últimas. Procuro uma saída para amenizar o cheiro de sardinha que assola a nós cidadãos brasileiros. Ninguém quer ter o direito a feder a peixe.

terça-feira, 4 de setembro de 2007

"O Bife com Batatas Fritas"

Roland Barthes
Mitologias


"O bife e o vinho compartilham a mitologia sangüínea. É o coração da carne; é esta em seu estado puro, e qualquer um que a consuma assimila a força do touro. Obviamente, o prestígio do bife deve-se ao seu estado de simicrueza: nele o sangue é simultaneamente visível, denso, compacto e suscetível de ser cortado: imagina-se logo a ambrosia antiga sob a forma de uma matéria pesada que diminui entre os dentes, de modo a fazer com que se sinta ao mesmo tempo a sua força de origem e a sua plasticidade se expandirem no próprio sangue do homem. O estado sangüíneo é a razão de ser do bife: os graus de sua preparação são expressos não em calorias, mas em imagens de sangue(...) A sua preparação, mesmo moderada, não pode se exprimir francamente; para este estado contrário à natureza, é necessário um eufemismo: diz-se que 'o bife está no ponto´, o que, na verdade, é apresentado mais como um limite do que como uma perfeição.
Comer um bife sangrando representa assim, ao mesmo tempo, uma natureza e uma moral (...) E assim como o vinho se transforma, para um bom número de intelectuais, em substância mediúnica que os conduz à força original da natureza, do mesmo modo o bife é para eles um alimento de redenção, graças ao qual tornam o seu cerebralismo mais prosaico e conjuram, pelo sangue e a polpa mole, a secura estéril de que são acusados.
A moda do bife tártaro, por exemplo, constitui uma operação de exorcismo contra a associação romântica da sensibilidade e do aspecto doentio: na preparação do bife tártaro, estão presentes todos os estados germinantes da matéria: o purê sangüíneo e a clara viscosa do ovo, um concerto de substâncias moles e vivas, uma espécie de compêndio significativo das imagens dos prelúdios do parto.
Tal como vinho, na França o bife é um elemento básico, mais nacionalizado do que socializado, estando presente em todos os cenários da vida alimentar: chato, debruado de gordura e em forma de sola de sapato nos restaurantes baratos; espesso e suculento nos restaurantes especializados; cúbico, o coração úmido, sob uma fina crosta carbonizada, na cozinha de primeira; participa de todos os ritmos, desde a confortável refeição burguesa ao lanche boêmio do celibatário; é uma alimentação simultâneamente rápida e densa, que realiza a mais perfeita união entre a economia e a eficácia, a mitologia e a plasticidade do seu consumo..."

terça-feira, 21 de agosto de 2007

A Endoscopia dos Vegetarianos

Fiquei um tempo sem escrever porque virei vegetariana e plantadora de erva-cidreira. Como tenho apenas quartas e quinta-feiras livres, decidi aprender a lidar com sementes, soja e trocentos legumes que não conhecia.

Mas não foi assim tão fácil virar saudável. Tudo começou como um soco no estômago. Três dias de ressaca, por culpa dos meus cinco cafés por dia, nada no jantar e cerveja quatro vezes por semana.

O médico apalpou minha barriga dizendo, "é temos aqui uma leve gastrite...você vai ter que fazer uma ENDOSCOPIA".

A palavra fez doer ainda mais o estômago, lembrei do que meu avô contava, daquele cano, que na ponta leva uma minicâmera, descendo pela goela até a extremidade do corpo. Nojo.

Para me livrar do tal exame endoscópico decidi limpar o corpo eu mesma. Agora pela goela ao invés de canos, descem quibes de abóbora, pães integrais, medalhões de ricota e sucos de cidreira.

Talvez comece a escrever sobre carnívoros e viciados em cafeína para suprir meu intenso desejo por aquilo que eles consomem, aliviando assim meu subconsciente.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Você sabe o que é Cochonila?

Pesquisando receitas vegetarianas no site www.vegetarianismo.com.br encontrei mais uma denúncia daqueles que não comem carne às atrocidades cometidas pelos carnívoros.
Falo da Cochonila. Que segundo o site é "um corante vermelho intenso feito com corpos secos de Dactylopius coccus, um inseto mexicano. Bilhões de insetos são criados e destruídos todo ano na fabricação de um corante vermelho usado em sobremesas, leites de soja sabor morango, roupas etc". Bizarro.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Para os comentadores

Não posso deixar de fazer menção aos comentários dos prezados Carlos Cecconello e Clara Caldeira, que se encontram no artigo da "Bunda" e do afrancesado La Serveuse. Devo agradecer por aqui mesmo, já que é muito bizarro comentar no meu próprio blog.
Estranho porque não é como responder um e-mail ou mandar um "scrap" de volta no yogurte. Pois apesar do papel que devo assumir de mediadora, parece que estou respondendo para mim mesma.
Sobre a fronteira entre literário e jornalístico (fez cócegas no umbigo ler isso de dona Caldeira!) ouvimos hoje mesmo de nosso "Walter Ego" a classificação das crônicas que é entre a arte e o jornalismo. Espero poder viver sempre nesse lugar aliás! E o texto The Tv Cave é meu (opa). A sessão leitura, aconteceu na aula do Faro.
E quanto à Cecconello, agradeço a compreensão em relação a minha figuração como garçonete aos fins-de-semana, e devo dizer que você deveria colocar no youtube a sua encenação como batedor de pênalti nas eleições, "mais um brasileiro participativo, votando com carinho"!uhuhu, rsss...
Um abraço queridos!